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    Artigo

    O protagonismo do mercado de loteamentos no pós-pandemia

    Por Guilherme Werner, sócio da Brain Inteligência Estratégica

    Agosto/2020

    Não é de hoje que o mercado de loteamentos é um agente protagonista no cenário da indústria imobiliária brasileira, sendo o segmento com maior presença em todos os cantos do país: dos eixos de expansão urbana aos bairros já valorizados. Entretanto, diante do atual cenário, todos precisamos traçar previsões para um futuro pós-pandêmico, e este também é o objetivo do artigo. Para “fins comerciais”, portanto, o título cabe bem, justamente no sentido de chamar atenção sobre como os desenvolvedores urbanos podem impulsionar seus empreendimentos daqui para frente.

    Com o advento da Covid-19, muito tem se falado sobre como será o “novo normal”. Particularmente, não gosto do termo. Não pelo fato de ele estar estampado em nove de dez artigos e notícias que li nos últimos meses, mas por, sinceramente, não acreditar que as nossas necessidades e anseios irão mudar tão drasticamente quando tudo passar. Além disso, a própria história nos diz que, em pandemias que a humanidade enfrentou no passado, a concepção de cidades não foi alterada de forma substancial, ou seja, o que se viu foram hábitos sendo criados ou ressignificados, mas a lógica de crescimento urbano das cidades se manteve ilesa às crises sanitárias pelas quais a humanidade passou. Somos seres sociais e, como tais, precisamos nos sentir constantemente inseridos e “aglomerados” em nossos mais diversos arranjos e agrupamentos aos quais pertencemos.

    Como contraponto, há os que acreditam que a crise do Coronavírus, infelizmente tão devastadora e cruel, será o grande marco na história da humanidade que nos alçará, em definitivo, para o século XXI –  na mesma linha de pensamento de Eric Hobsbawn, na indispensável leitura de “A era dos Extremos” (1994), em que, para o autor, o século XX foi breve, iniciando-se de fato em 1914, em Sarajevo, onde foi desencadeada a Primeira Guerra Mundial, e acabando com a queda da União Soviética, em 1991. De fato, ainda que nosso século seja breve e que tudo mude daqui para frente, no que diz respeito ao mercado imobiliário, não conseguimos vislumbrar quais são as tendências de que tanto se falam e que surgiram instantaneamente a partir do último 20 de março, quando iniciou-se o processo de isolamento social em boa parte das grandes cidades brasileiras.

    Não é que nada mude neste futuro breve, já que a pandemia deverá, sim, ser um agente catalisador de tendências. Ou seja, se for para apostar, acreditamos que questões que já eram tratadas anteriormente nas concepções de produtos imobiliários, ainda que de forma tímida, tal como o home office, deverão ficar cada vez mais evidentes nos empreendimentos imobiliários durante este novo ciclo que se inicia. O cuidado, portanto, é em não se ter um prognóstico precoce do que é tendência remota para o que realmente veio para ficar.

    No que se refere ao desenvolvimento urbano em si, historicamente, o lote/casa sempre foi o grande produto imobiliário brasileiro. Mesmo que a incorporação imobiliária vertical, naturalmente, seja um gigantesco mercado e que, embora não seja o tema deste artigo, também possua um grande fôlego para expansão nos próximos ciclos imobiliários, o nosso país é – e ainda será por muito tempo – um país horizontal, onde grande parcela da população reside em uma casa. Para ilustrar, o índice de verticalização no Brasil (PNAD, 2019) é de 10%, o que nos faz concluir que apenas um décimo dos domicílios brasileiros são apartamentos. Pode parecer pouco, mas muitas vezes acabamos superestimando a verticalização de nossas cidades. Na maior cidade do país, a título de exemplo, a verticalização bate 28%, ou seja, mesmo em São Paulo, o epicentro da incorporação imobiliária vertical do país, grande parcela das famílias ainda habita em residências horizontais.

    E isso fica muito bem percebido quando sentimos “na ponta”, junto aos potenciais compradores de imóveis do Brasil, qual seria o seu imóvel de desejo. Com base em mais de 22 mil questionários aplicados pela BRAIN com este público nos últimos meses, em todo o país, podemos afirmar que 72,4% desta população atesta que o imóvel de desejo de compra seria um lote ou uma casa. Obviamente, quanto maior a cidade ou maior a renda deste comprador, menor este percentual, ou seja, nestes casos, evidencia-se mais a necessidade de compra de um apartamento por atributos de segurança e localização. 

    Sabemos, também, que muitas vezes o imóvel de desejo se distancia do que efetivamente aquela família vai comprar. Não é raro escutarmos histórias de vendas nas quais o objetivo da família adquirente era uma casa em condomínio, mas a efetivação foi um apartamento mais compacto, mas melhor localizado, aquele que realmente coube no bolso. No fim do dia, o que manda é a renda!

    Mesmo com todas estas variáveis expostas acima, seguramente, os percentuais de captura de demanda que o mercado de loteamentos possui ainda são majoritários perante demais segmentos imobiliários, o que nos faz pensar que, daqui em diante, isso também possa permanecer. Para ilustrar, apossando-se de mais um clichê que a pandemia nos trouxe, aqui vai mais uma lista que você lerá neste período, elencando 8 motivos que nos fazem acreditar na perpetuidade do protagonismo do desenvolvimento urbano no mercado imobiliário brasileiro:

    1) Urbanismo ganha ainda mais força sob um apetite de compra alicerçado no aumento da qualidade de vida, a qual, mais do que nunca, gera o esforço do consumidor em prezar por aspectos que lhe atendam neste sentido;

    2) O lote é, essencialmente, o grande produto de investimento imobiliário no Brasil. Dada a atual conjuntura econômica, com redução das taxas de juros e com renda fixa não remunerando os investidores de forma satisfatória, há um claro impulsionamento de vendas para estes fins;

    3) Revalorização do “verde” e de maior apreço por aspectos paisagísticos podem ser ainda mais explorados e, sabe-se bem, este é sempre um ponto forte de qualquer produto horizontal;

    4) Impulsionamento nas vendas de estoques prontos, sobretudo em padrões médio e alto, dado aos custos de oportunidade atuais no que tange às baixas performances da renda fixa, como já dito anteriormente, aliada à possibilidade de mudança imediata;

    5) Mesmo que o êxodo urbano não deva ocorrer de forma estruturada, como alguns acreditam (ainda mais após anúncios de empresas mudando suas sedes para o interior), há uma clara movimentação, principalmente em alguns estratos de rendas superiores, para uma busca por moradias em eixos mais interioranos, fomentando o mercado de loteamentos, seja para primeira ou segunda moradias;

    6) As dificuldades de licenciamento e morosidade na aprovação de empreendimentos fazem com que o mercado de loteamentos, essencialmente, não tenha superoferta, favorecendo assim a liquidez dos produtos, inclusive para o mercado de casas prontas, que é escasso em todo o país;

    7) Novas linhas de crédito para compra de lote e casa, embora gerem uma natural desconfiança de parte do empresariado do setor – sobretudo por experiências frustradas em um passado não tão distante – podem favorecer um incremento da demanda potencial;

    8) Dada a pandemia, e com a percepção de distância podendo ser algo mais relativo e menos substancial no momento da compra, há uma possível alavancagem para compras em “bordas da cidade”.

    No fim, talvez nenhum de nós possua perspicácia tão grande quanto a de Hobsbawn, ou pode ser cedo para afirmar (com certeza é!) e ter um veredicto de que este atual período será, informalmente, o verdadeiro início do século XXI. O que dá para arriscar, sim, ainda que nenhum de nós possua uma bola de cristal (nem mesmo nós, consultores de mercado), é que, muito provavelmente, chegaremos ao final deste século sem nenhuma tecnologia que substitua o nosso teto, a nossa casa.

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