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    LGPD tende a ser prorrogada; medida afeta imagem do Brasil

    Projeto de Lei que inclui adiamento da vigência aguarda votação na Câmara

    Henrique Cisman

    28/04/2020

    O início da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) está prestes a ser prorrogado para janeiro de 2021. A medida consta no Projeto de Lei nº 1.179/2020, de autoria do senador Antônio Anastasia, já votado e aprovado no Senado no último dia 3. O PL ainda precisa de aprovação na Câmara dos Deputados.

    No dia 14 de abril, o Ministério Público Federal enviou nota técnica ao Congresso na qual se manifesta pela manutenção do prazo conforme estipulado – agosto de 2020. De acordo com o MPF, um novo adiamento vai passar imagem negativa do Brasil à comunidade internacional – vale lembrar que a vigência já foi prorrogada uma vez, de 18 meses para 24 meses após a publicação da Lei nº 13.709/2018.

    Referência no assunto, Patricia Peck, sócia do escritório PG Advogados, destaca que é essencial haver legislação específica de proteção de dados pessoais para um país do porte do Brasil, sendo inclusive exigido para a entrada na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico). “A União Europeia passou a exigir que os países com os quais realiza negócios tenha legislação de mesmo nível de adequação”, complementa.

    Para efeito de comparação, os vizinhos Argentina e Uruguai já são reconhecidos pela Europa no que tange à proteção de dados pessoais. Para que isso ocorra também com o Brasil, é necessário que a LGPD comece a vigorar e que haja autoridade específica de fiscalização, conforme explica Peck: “A ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados) foi criada em 2019, na Lei nº 13.853, mas essa autoridade ainda não foi efetivamente empossada”.

    A advogada Mariana Nogueira, sócia do escritório Leite, Tosto & Barros, ressalta a importância da legislação para os negócios: “Se o Brasil não entrar nessa onda, muitas empresas que negociam com o mercado estrangeiro podem ser prejudicadas por não haver regras claras neste sentido. Tal como a lei anti-crime de compliance, é uma lei que vem para ficar e as empresas terão que se adequar”, afirma.

    Prorrogação faz sentido?

    Para Nogueira, o adiamento faz sentido do ponto de vista econômico, já que a adequação à norma exige investimentos. “Porém, as empresas teriam que estar adiantadas em seus projetos para a entrada em vigor da LGPD em agosto deste ano. Dependendo do tamanho da empresa, não é um projeto que se faz em 2 ou 3 meses”, contrapõe a especialista.

    Já Patricia Peck pontua que o Projeto de Lei nº 1.179/2020 envolve uma série de medidas emergenciais e transitórias no direito privado para o período de pandemia. Por outro lado, as previsões da LGPD no tocante à proteção dos dados pessoais é extremamente valiosa neste momento, já que proporciona garantias para todos os envolvidos no manuseio desses dados, especialmente os relacionados à saúde.

    “Isso significa que tem uma lei específica para tratar a matéria, o que aumenta a segurança jurídica nas relações. Se já houvesse as bases legais da LGPD neste período, seria mais fácil trazer as justificativas. Por ora, fica tudo muito confuso e subjetivo – é até mais fácil receber uma notificação”, destaca Peck.

    A especialista compara a prorrogação da LGPD ao isolamento social: faz sentido, porém tem consequências adversas (retração econômica). Em relação à LGPD, o primeiro efeito negativo é a desmobilização das empresas para a adequação, argumento endossado por Mariana Nogueira: “Talvez não seja a maior preocupação ou o gasto mais proeminente neste momento de crise”. 

    O segundo efeito colateral, segundo Peck, é moral: “Pode gerar a falsa impressão de que a lei não vai pegar. Em 2019, já houve uma série de autuações e notificações, principalmente pelo Ministério Público e pelo Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), sobre tratamento de dados pessoais, a maioria delas via menção ao Marco Civil da Internet e à própria LGPD”.

    Na nota técnica redigida pelo Ministério Público Federal, o órgão destaca que a pandemia aumenta a importância da LGPD, o que inclusive demonstraria o comprometimento do Brasil com a proteção de direitos, “pondo em marcha a rota do país para a harmonização legislativa internacional que abre inúmeras portas ao desenvolvimento do País”. O MPF coloca como alternativa adiar as penalizações, mas não o início da vigência da lei.

    Tendência é que LGPD seja mesmo prorrogada

    A especialista Patricia Peck explica a tramitação: “O PL é um pacote de medidas que não trata somente da LGPD e inclusive tem apoio do presidente do STF, Dias Toffoli. Se a Câmara alterar, gerar emendas, ele tem que voltar ao Senado. Se lá sofrer emendas de novo, volta para a Câmara. Se é para ser um pacote de medidas emergenciais, a ida e vinda pode acabar diminuindo sua eficácia”. 

    Neste contexto, ela acredita na ação coordenada: “A menos que haja muitas emendas, muitas alterações relevantes, não vejo possibilidade de alterar apenas o assunto da LGPD. É a questão de sacrificar o todo por causa de um tópico. Provavelmente, será um resultado combinado, sem bate-volta entre as casas”.

    De acordo com Mariana Nogueira, o escritório foi bastante procurado por empresas de grande porte para adequação às normas já no ano passado. Para os projetos em andamento, Patricia Peck tem orientado seus clientes a dar continuidade: “A energia para mobilizá-lo de novo pode ocasionar problemas de prazo. A empresa acha que ganhou tempo, mas na verdade esse prazo é uma ilusão”.

    Se o PL 1.179/2020 for aprovado sem alterações, a vigência da LGPD passa para janeiro e as penalizações somente serão aplicadas em agosto de 2021. “O mais importante é que a ANPD seja efetivamente criada, que é quem realmente vai apurar tudo isso”, salienta Nogueira.

    No tocante às punições, apesar da estagnação da ANPD e da prorrogação das multas, Peck destaca que o PL não altera o artigo 18 da LGPD, que em seu parágrafo oitavo possibilita que as denúncias sejam feitas aos órgãos de defesa do consumidor: “As instituições sujeitas à vigilância do órgão de defesa do consumidor estão à mercê – a partir da entrada em vigor – de penalidades que já estavam previstas pelo próprio CDC, e isso é muito importante destacar”.

    Em suma, a prorrogação de pouco mais de quatro meses, embora possa dar algum fôlego, não altera a necessidade de adequação às normas de proteção de dados. Ainda, a legislação é fundamental para elevar a credibilidade do Brasil e de suas empresas no cenário internacional, mesmo que internamente sequer esteja estruturada a autoridade nacional de fiscalização.

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